A companhia Mau Artista, do Porto, encontra-se em residência artística no Teatro da Rainha. Do Porto para as Caldas da Rainha, mais concretamente para a antiga lavandaria do Centro Hospitalar Oeste Norte, onde prepara o espectáculo Dodô – no rasto do pássaro do sono de Joseph Danan.

Trata-se de um projecto que surge do facto de Fernando Mora Ramos ter sido professor, no âmbito dos espectáculos de final de licenciatura na ESMAE, da maior parte dos integrantes deste projecto, em particular o actor e encenador Paulo Calatré, que também entra como actor na última criação do Teatro da Rainha em coprodução com o TNSJ, Letra M (texto de J. Sazz, pintura e cenografia de João Vieira e encenação de Fernando Mora Ramos). Destas experiências anteriores e num processo que é natural, surgiram cumplicidades que, felizmente, vêm sendo concretizadas em trabalhos de criação. Portanto, Dodô – No rasto do pássaro do sono dá seguimento a esse processo de cumplicidade a caminho de um verdadeiro aprofundamento de uma relação entre criadores.

Tratando-se de um trabalho dedicado ao público infanto-juvenil, a que o Teatro da Rainha dedica uma parte significativa do seu trabalho em 2010/11 e tendo o Mau Artista alguma experiência de contacto com este tipo de públicos, a Direcção Artística do Teatro da Rainha entendeu que um caminho possível, para alargamento das próprias capacidades artísticas e organizativas, mas também para um aprofundamento da relação entre as partes, seria exactamente o de convidar o Mau Artista a realizar em parceria com o Teatro da Rainha, uma Residência Artística.

Dôdo, no rasto do pássaro do sono é um objecto único mais do que singular, uma flor no deserto, já que não há notícia da existência sequer de uma actividade teatral profissional dedicada a infância na Região Oeste. As crianças são desejadas e protegidas, quando são, e depois são tratadas ou numa lógica de ocupação total dos tempos, encarceradas sempre num activismo constante, ou ignoradas justamente naquilo que são, outra idade, outras possibilidades de inventar e aprender, outro mundo, um mundo próprio – claro que felizmente há excepções. Ora No rasto do pássaro do sono, é justamente a abertura de um espaço de encontro entre as crianças, entre crianças e professores e entre crianças e adultos e menos adultos. Há no projecto uma vocação íntegra, ecuménica, por assim dizer, iniciática e universal.

sexta-feira, 9 de abril de 2010

Estreia 16 de Abril

Após uma cirurgia de urgência que obrigou a adiar a estreia, a actriz Patrícia Queirós encontra-se restabelecida, tendo sido já marcada nova data de estreia no 16 de Abril, às 21h30, na Antiga Lavandaria do Centro Hospitalar Oeste Norte, Caldas da Rainha (junto ao Museu do Hospital e da Cidade). O espectáculo mantém-se em cena nos dias 17 de Abril, 07 e 08 de Maio, às 21h30 e 24 e 01 de Maio às 17h00.

quinta-feira, 8 de abril de 2010

Soube então porque escrevia peças para crianças

A primeira vez que fui à Reunião tinham-me pedido para fazer parte do júri de um Festival escolar. A segunda, convidaram-me para animar um estágio sobre As aventuras de Aureen, o pequeno serial killer, a minha primeira peça para a infância. Tinha o meu chapéu de escritor, o de professor e um terceiro para o sol. Na terceira vez…o estágio foi mesmo à frente, na ilha Maurícia. Que seja claro: estava na ilha Maurícia para trabalhar, não eram férias, mesmo se aproveitei para tirar uns dias de férias. Na altura, disse para mim: não é desagradável, ser escritor, dá trabalho mas é-se recompensado. Foi na ilha Maurícia que me veio a ideia da minha peça sobre o dôdo. Foi necessário voltar mais uma vez propositadamente. Que fosse até à ilha de Rodrigues. Que apanhasse o avião e o barco e que fizesse umas fotos. Nessa altura, na longínqua Europa, Elias preparava-se para nascer. Elias é o meu filho. A primeira criança de alguém que até então, demasiado ocupado a escrever peças para crianças (e também para os grandes), se tinha esquecido de as fazer (crianças). Enquanto viajava, ele aumentava no ventre da sua mamã e enviava-me SMS em que me contava a sua vida de bebe ainda não nascido. Soube então porque escrevia peças para crianças.

Joseph Danan

Carta da Terra para Crianças

Perdido no Sonho

Miguel Araújo


Em pequenos tudo nos parece grande, talvez por não termos bem a percepção real do nosso tamanho e do que nos rodeia.
Um pequeno presente é recebido com um enorme entusiasmo e pode transformar-se no veículo de uma grande aventura.
Quando o motor é a curiosidade, tudo é possível. Comburindo imaginação, levantamos voo, deixamo-nos perder e quando julgamos encontrar o destino final ele revela-se apenas mais uma refinaria onde a realidade é imaginada, reabastecemos e descolamos novamente.
Encontrar um dodô ao vivo e a cores pode parecer um sonho no entanto pode ser bem real, se considerarmos que o celacanto, um peixe do periodo cretáceo, que se presumia extinto, em 1938 obrigou todos os cépticos a mudar de opinião de uma forma inabalável aparecendo na costa leste da África do Sul.
Mas mesmo que já não exista ao vivo e a cores, seja o que for que já não o é, pode sempre o ser dentro de nós desde que conservemos a nossa capacidade de sonhar. Procurando por um sonho ou sonhando a procura.

Miguel Araújo, o Rapaz

(c) Margarida Araújo

Fotos de Ensaio#6



Miguel Araújo, Nuno Preto, Sofia Araújo
Marionetas de Sandra Neves

(c) Margarida Araújo


Fotos de Ensaio#5

Marioneta de Sandra Neves

(c) Margarida Araújo

quarta-feira, 31 de março de 2010

Dodô toca um solo


Ano Internacional da Biodiversidade 2010



Em 2010 comemora-se o Ano Internacional da Biodiversidade, uma iniciativa das Nações Unidas
para promover a consciencialização da sociedade no que respeita à importância da biodiversidade, às ameaças que enfrenta, e à urgência dos esforços para promover a sua conservação.

A biodiversidade são todos os ecossistemas e espécies de seres vivos que fazem parte da Terra. A biodiversidade é resultado do processo da evolução e das relações entre cada um dos componentes que a constituem, por isso a espécie humana depende da biodiversidade para a sua sobrevivência.

Dodô – No rasto do pássaro do sono, aborda uma importante questão que coloca em risco toda a biodiversidade: a extinção de uma espécie animal, como consequência da acção do Homem. Actualmente o Homem é o grande resposável pela destruição da natureza, motivados por interesses próprios, atitude que coloca em risco o planeta.


Sabias que...?


o habitat natural dos dodôs eram as Ilhas Mauricias, situada na costa leste de África, no Oceano Indico? A Ilha foi descoberta pelos Portugueses em 1505, mais tarde foi colonizadas pelos Holandeses que lhe deram o nome em honra do principe Maurice de Nassau. A capital da Ilha, cujo Arquipélago é constituído pela Ilha de Reunião e pela a Ilha de Rodrigues, é Port Louis.


terça-feira, 30 de março de 2010

Sabias que...?



O dodô é uma das personagens de Alice no País das Maravilhas, do escritor inglês Lewis Carrol?

Que mais tens dentro da algibeira? – perguntou, voltando-se para Alice.
- Apenas um dedal – respondeu Alice tristemente.
- Trá-lo aqui – disse o Dodó.
Mais uma vez, todos os se reuniram à volta dela, enquanto Dodô exibia o dedal, dizendo com solenidade:
- Pedimos-te que aceites este lindo dedal.

O Dodô acabou por conhecer a fama a partir de 1865, data da primeira publicação de Alice no País das Maravilhas. A obra tornou-se um best-seller, e o dodô, simpática e curiosa personagem da história, ganhou uma nova vida, tornado-se conhecida. A partir daí, o imaginário popular apropriou-se dela, como o tal pássaro muito desajeitado e mais tonto ainda.

Em ensaios...


Sabias que?



...o nome dodô deriva do português arcaico dodo, que significa doido? Acredita-se que quando os portugueses chegaram à Ilha Maurícia, em 1505 e viram pela primeira vez tão curiosa ave, foram inspirados pelo ar desajeito desta. O nome dodô foi-se generalizando e é assim conhecido em todo o mundo.

segunda-feira, 29 de março de 2010

Sabias que...



...o dodô era da familia dos pombos, pesava cerca de 50 quilos, tinha pouco mais de um metro de altura e alimentava-se principalmente de frutas? O dodô construia o seu ninho no chão, pois era uma ave não voadora.

Fotos de ensaio#4










Miguel Araújo e Sofia Araújo

Fotos de Ensaio#3













Patrícia Queiroz e Nuno Preto

Fotos de Ensaio#2









Sofia Araújo, Patrícia Queiroz e Nuno Preto

Fotos de Ensaio#1














Miguel Araújo



terça-feira, 23 de março de 2010

Uma inocência (a da infância)


É por essa razão que muitos autores usam a imagem da travessia de uma floresta: ao sair da infância temos de atravessar uma floresta, uma floresta muito obscura e impenetrável. Se conseguirmos sair dela, então uma nova forma que se pode chamar de inocência será encontrada. Uma inocência (a da infância) é dada, a outra é para descobrir.
Peter Brook, Entre dois silêncios, Actes Sud, Junho de 2006

Imagens retiradas do livro A la poursuite de l’oiseau du sommeil, de Joseph Danan, editado pela Act Sud – Papiers, em Março de 2010.




Entrevista a Paulo Calatré, por Fernando Mora Ramos

1.Trata-se de um primeiro espectáculo dedicado a um público infanto-juvenil.

O que é que isso traz de novo, ou não, nos modo de fazer?

Na realidade trata-se da minha segunda experiência dedicada a um público infanto-juvenil, o primeiro foi Gil & Vicente - uma viagem de barca ao Inferno, de Gil Vicente, espectáculo que o Mau Artista estreou em 2008 e que ainda está em digressão.

Quanto aos modos de fazer, não tenho diferentes modos de abordar um texto ou partir para a construção de um espectáculo. Tento, primeiro que tudo seguir os meus instintos e em conjunto com a restante equipa dar largas a imaginação; normalmente trabalho sobre uma estrutura que vou traçando à medida que faço a dramaturgia do texto, proponho improvisações aos actores e a partir daí aproveito tudo o que serve para a construção do universo do espectáculo. Agrada-me a ideia de que os actores estejam sempre em processo de improvisação, não querendo com isto dizer que não vá marcando as cenas, mas eles são livres para acrescentar sempre mais, se os impulsos
criativos surgirem e nas últimas semanas limpamos o que está a mais. É um caminho difícil e muito intenso, principalmente para os actores que estão sempre a trabalhar sem rede, mas que me parece gratificante, ajuda os actores a terem uma representação sempre fresca. Aborreço-me facilmente quando vejo os actores a cumprirem uma marcação e a acomodarem-se a ela, a representação acaba por ficar mecânica e sem vida. Diria que as minhas preocupações quando faço um espectáculo Infanto-Juvenil são a duração, por causa do tempo de concentração das crianças que é diferente dos adultos e ter vários níveis de leitura, acho aliás fundamental, pois são também espectáculos para a família e interessa-me que os adultos não sejam só acompanhantes, mas espectadores activos.


2. Sendo um texto que trabalha o sonho - chama-se No rasto do pássaro do sono, o que é revelador, tanto pela palavra rasto como pelas actividades próprias do sono -, universo em que as relações entre o espaço e o tempo ganham uma elasticidade diria surrealista, muitas vezes comprimindo-se o tempo, dando saltos imprevistos, outras vezes ampliando-se o espaço - quantas vezes não voamos nos sonhos e quantos de nós não o fazem com prazer? - Como pensas materializar a matéria, passe a redundância, em cena? Não há nada mais complicado nos sonhos do que o próprio corpo…

O universo do sonho permite-nos algo extraordinário que é podermos sair da lógica do real, as coisas não têm que fazer sentido. Neste espectáculo tento jogar com isso, criei um universo plástico que desafia constantemente a realidade, brinco com as proporções, com a elasticidade do tempo, com o espaço, faço flutuar os personagens num lugar onde por vezes não existe chão nem paredes, jogo com a aparência do real, com o sonho dentro do sonho, utilizo sombras chinesas e marionetas que contracenam com actores de
carne e osso mas que, mesmo sendo matéria palpável, se tornam irreais pelo registo das suas actuações oscilando entre o burlesco e o clown, utilizo uma banda sonora feita quase exclusivamente com sons produzidos com a boca, como fazem as crianças quando brincam, e isso permite-me criar um mundo onde tudo é possível, por mais surreal que pareça, creio aliás que é precisamente o surrealismo e a inverosimilhança que nos fazem acreditar que estamos de facto a sonhar.


3. O Dodô é um pássaro extinto, mas é primo de todos os pássaros. Como é falar de um mito? Como trazê-lo ao nosso convívio com a presença da ficção? Uma presença diria tão real quando a imaginação possa sê-lo, essa arma de prazeres e voos. Vai voar de novo?

Falar de mitos é sempre complicado, mas neste caso estamos a falar de algo muito real, estamos a falar da extinção de um pássaro que representa a extinção de todas a espécies, incluindo a do próprio homem, algo muito presente na actualidade. Estamos a lidar com o aquecimento global, com mudanças climatéricas que ameaçam mudar o planeta na forma como o conhecemos hoje, fala-se de clonar espécies extintas mas não protegemos as que estão em vias de extinção e somos de tal forma bombardeados com estas informações que se tornam banais ao ponto de já não sabermos se o que ouvimos é real ou sonhado. Através da ficção conseguimos abordar estes temas de uma forma lúdica, convidando à reflexão sem que pareça uma coisa maçadora, com a ficção deixamo-nos levar como num sonho e sem querer estamos a falar do real.


4. Como se sentem no espaço da Lavandaria? Ajuda a voar?

Parece-me importante habitar estes espaços, estão carregados de história e de histórias, no caso da Lavandaria, mais ainda porque se trata também de um espaço de teatro local, de sonho por natureza. Estamos a ser inspirados por essas memórias e pelos murmúrios das árvores vizinhas, pelo chilrear dos pássaros, por vozes distantes mas ao mesmo tempo próximas, sons esses que também habitam o nosso espectáculo, e até mesmo pelo sino que nos lembra, de tempos a tempos, que existe um mundo lá fora e que são horas de fazer uma pausa no nosso voo e descer à terra para comer alpista.


5. Tratando-se de um espectáculo para infância será que vai tocar com a mesma candura os muito mais velhos?

Como referi anteriormente, entendo que os espectáculos para a infância nunca são exclusivamente para a infância, as crianças não vão sozinhas ao teatro, são sempre acompanhadas por adultos, quer sejam professores, pais ou outros adultos. Nesse sentido tento construir o espectáculo de forma a ser desfrutado por todos, em que existam referências que possam ser lidas de diferentes modos e que no final possam ser partilhadas por ambos. Neste caso o texto ajuda muito, aborda temas que são comuns a diferentes gerações e fá-lo através de um sonho, de uma aventura, que numa primeira leitura será a busca do Dodô um pássaro extinto, mas que se torna numa viagem em busca da nossa própria identidade, do nosso lugar no mundo e da forma como o apreendemos, um sonho que nos faz perder para nos encontrarmos, e isso é algo transversal a todos.


6. Sei que vai ser uma experiência interdisciplinar. O que é que nesse diálogo entre disciplinas será ainda mais atractivo?

O texto do Joseph Danan tem uma estrutura narrativa complexa, o espaço e o tempo estão sempre a mudar, tem viagens de avião, de barco, ora estamos num restaurante e logo a seguir numa ilha deserta, saltamos do presente para o passado ou para o futuro num abrir e fechar de olhos. A utilização de diferentes disciplinas, permite-nos contar a fábula sem que para isso necessitemos de grandes meios técnicos, e com uma fluidez que ajuda a manter o ritmo necessário para o espectáculo. Por outro lado parece-me mais enriquecedor poder contar a história em diferentes linguagens, não só para quem faz, mas principalmente para quem vê. A manipulação de objectos, de marionetas, as sombras chinesas ou a técnica de máscara, combinadas com o trabalho do actor, a sonoplastia e a luz, ajudam a criar um mundo que surpreende constantemente o espectador e o transporta para o mundo do sonho.


7. O teatro para a infância merecia mais do que a política do Ministério prevê, isto é, mais do que este grau zero da existência não será? Que dizer de um poder que estrutura assim, desprezando, a possibilidade por exemplo da criação de um Teatro nacional para a Infância? Isso não teria qualquer coisa a ver com o tal Bullying de que todos falam? Sentes que há uma verdadeira preocupação com as crianças? Ou que apenas há ansiedade e drama, mesmo falta de inteligência estruturada e estruturante?

Se pensarmos que a política do Ministério está ainda numa espécie de grau zero da existência para todo o tipo de criação, que os problemas de hoje são os mesmos de há vinte anos, que os apoios estatais continuam a ser insuficientes, não passando de pequenas migalhas que ajudam à sobrevivência moribunda das companhias, algumas delas arrastando-se já numa existência decrépita e bolorenta, não deixando espaço para o crescimento das novas companhias; se pensarmos que os apoios aos jovens criadores são uma realidade com poucos dias e que se forem geridos como os restantes apoios estatais para a cultura atribuídos com meses de atrasos e com valores irreais que não correspondem aos verdadeiros custos de produção; Se pensarmos que se construíram (e continuam a construir), dezenas de Auditórios Municipais, Casas da Cultura, Casas da Artes e outros espaços, na sua maioria fechados por falta de orçamento ou com uma programação desajustada, muitas delas geridas por autarcas ou funcionários camarários sem qualquer experiência em gestão cultural, percebemos rapidamente que o teatro está em sérias dificuldades e o teatro para a infância mais ainda.
Não existe uma política para a cultura e muito menos uma especifica para a infância. O Ministério da Cultura e da Educação não dialogam para a criação de uma politica comum, que invista na educação pela cultura, as escolas fecham-se nas suas rotinas cinzentas, com pouca imaginação nas forma de leccionar, contentores onde os pais deixam os filhos, desresponsabilizando-se, muitas vezes, pela sua educação; a televisão e os videojogos são cada vez mais a companhia das crianças, substituindo as brincadeiras que envolvem a imaginação. Não posso dizer que não existe investimento nas crianças, mas qualquer que ele seja será sempre pouco, e neste momento é muito pouco e estamos, cada dia que passa, a pagar caro esse pouco investimento.

8. Esta pergunta é para tu fazeres. O que queres perguntar aos leitores?
Pequê, pequê qu’eu era, tã dentro da floré stava qu’á notê os pássar me comê. Então? Não adivinham

segunda-feira, 22 de março de 2010

Joseph Danan

Joseph Danan nasceu em 1951, em Oran.

Escritor, professor e dramaturgo, foi Director do Instituto de Estudos Teatrais da Universidade Paris-III Sorbonne Nouvelle, onde ensinou dramaturgia contemporânea e dirigiu diversos ateliers de escrita.

Os seus textos foram encenados por Alain Bézu (com quem colaborou durante anos no Théâtre des 2 Rives – Centro Dramático Regional Haute-Normadie), Jacques Kraemer, Julien Bouffier, Jean Deloche, Jean-Frédéric Chevallier (Mexico), entre outros.

Em 2008 fez uma residência artística, na Chartreuse – Centre National des Escritures du Spectacle (Avignon), onde escreveu Si J'étais un homme.

Recentemente descobriu o gosto pela escrita infantil, destacando-se as obras Jojo le récidiviste (collection « Heyoka Jeunesse ») e Les Aventures d'Auren le petit serial killer, publicadas pela Actes Sud-Papiers.

A la poursuite de l'oiseau du sommeil


A la poursuite de l'oiseau du sommeil de Joseph Danan, foi editado em 2010 pela Actes Sud.


A editora francesa, criada em 1978, desenvolve uma politica editorial generalista, abrangendo diversos departamentos, como a Actes Sud – Papieres, que se dedica à edição teatral, e na qual Joseph Danan publicou anteriormente Les Aventures d’Auren, le petit serial killer (2003), Jojo le récidiviste (2007), que fazem parte da colecção “Heyoka Jeunesse” vocacionada para o público infantil, e De la révolution (2007).



Para além da fábula


Para além da fábula, a peça de Joseph Danan, num registo dramático que estrutura quadros numa montagem hábil recorre além do teatro, ao cinema e às marionetas. Trata-se de uma verdadeira criação interdisciplinar que convoca os públicos infantes a que se destina, entre os 6 e os 12/13, para uma vivência compósita, em tudo distante da passividade que a televisão pede, já que o modo de montagem das cenas que conta a aventura do rapaz protagonista, numa dinâmica inteligente, promove simultaneamente uma viagem ao interior dos próprios mecanismos da ficção. O nosso jovem espectador, podendo identificar-se com o herói da peça, um rapaz que aliás tem um nome que é impronunciável, o que no fundo suscita a identificação, um desejo de nomear, viaja pelos modos diversamente artesanais e tecnológicos desta escrita, numa verdadeira descida – ou subida - aos sortilégios da ficção.

E a aventura não se queda pelo que é exterior, é uma aventura interior, uma viagem também feita para dentro, um momento de apreensão reveladora do mundo que pode ser vista como crescimento intelectual e sensível, como aprofundar da consciência de si e do mundo, como a descoberta da realidade como aquilo que é, natureza e ficção, negócio e liberdade vigiada, luta e conformismo instalado. Assim, em quadros da peça, saltando do puramente lúdico para as experiências da vida real, da publicidade omnipresente para o sonho imprevisto, da realidade com a sua bruteza para o medo do desconhecido, o rapaz faz de facto uma experiência de transformação e crescimento. Trata-se neste sentido de uma aventura intelectual e de uma possibilidade de viver um momento de flagrante emoção na descoberta de si pela libertação do medo. A peça é na realidade uma travessia do medo espicaçada pela curiosidade a caminho de uma desejada autonomia pessoal que só a experiência subjectivada e personalizada pode permitir, como é aqui o caso.

Fernando Mora Ramos

Dodô


Um rapaz muito novo descobre que o lápis que o tio Maurício lhe ofereceu tem uma cabeça de pássaro na ponta. Chama-se Dodô e dizem que desapareceu da terra. Fica intrigado e não resistindo à curiosidade voa para a ilha de Reunião de onde dizem ser nativo o Dodô. E procura-o depois de enfrentar as nuvens e um ciclone durante o trajecto aéreo. Em terra tudo se chama Dodô e fica finalmente a saber que o Dodô se extinguiu morto à paulada e comido pelos navegadores holandeses que exploraram a ilha. Mas ele não desiste, acha que poderá ainda haver nem que seja um, num sítio desconhecido de todos. E continua a pesquisa até que finalmente vê uma réplica no Museu de História Natural: um pássaro desengonçado no andar imaginável e ridículo, um pássaro que não voava, uma espécie de pato doméstico com uma touca de banho de senhora enfiada na cabeça. Entretanto, no arquipélago, entre noites misteriosas em que não distingue o sonho da realidade, - chega mesmo a dormir num jardim com duas meninas fantasma e a ver uma cena de tortura em que a patroa do Hotel, a tenebrosa Madame Tang, chicoteia um criado – resolve conhecer outras ilhas e vai até à Ilha de Rodrigues onde, no meio de um furacão, perdendo-se na natureza, acaba por dar com um estranho pássaro parecido com o Dodô, o Solitário de Rodrigues. E chega à fala com ele ficando a saber que tem uma história semelhante à do Dodô e que ele é mesmo o último dos Solitários.

Mais tarde o rapaz tornado grande torna-se um defensor do mundo natural e um conhecido ornitologista. Chega a ser premiado pelos seus esforços de conservação das espécies dessa zona da África Austral e fica a viver em Madagáscar, uma ilha próxima das Maurícias e da Reunião.

Um acto de imaginação


Dodô é um espectáculo sobre a aprendizagem, uma reflexão ecológica, um acto da imaginação.

Sobre a aprendizagem porque o protagonista da peça, o menino, vai descobrindo ao longo da sua aventura, meio real, meio sonhada, que por vezes não é por uma coisa ter um nome que a revela que esse nome seja o que diz: assim Dôdo, o pássaro, passa a Dôdo, a cerveja. E o nome pode, nesta sociedade de negócios, até ser outra coisa qualquer.
Até ao final da peça vai aprendendo muito mais: que é preciso saber ler e até conhecer outras línguas; que um pequeno roubo na casa de uma certa senhora é um grande crime e como os dodôs desapareceram da face da terra e regressaram de muitas outras formas.
Este desaparecimento conta-nos a história de como os incautos dodôs não sobreviveram à convivência com a espécie humana. Eles que eram pacíficos e segundo os registos culinários da época nem eram assim tão saborosos para os marinheiros com os quais se cruzaram sucumbiram à fome destes.

Neste ano de 2010, ano internacional da biodiversidade, nada mais apropriado do que recordar como a presença e os interesses dos homens continuam a interferir de maneira irresponsável na vida de tantas espécies animais por todo o planeta.
E é sobre a imaginação porque tudo é observado pelo olhar de uma criança, naquela idade em que se imagina mais do aquilo que se conhece do mundo. Um pouco entre a Alice de Lewis Carrol e o Calvin de Bill Waterson, se por um lado estão presentes as peripécias dignas de um País das Maravilhas, com a sua poesia onírica e personagens bizarras, por outro está um menino e a sua capacidade de ver o mundo à sua maneira, colorindo-o através das suas surpreendentes e constantes descobertas.

Dôdo é uma experiência iniciática, um modo de revelar o mundo através do olhar inocente de uma criança, olhar esse que, ingénuo, se converte num mecanismo de explicitação do que é desconforme e mesmo assassino no comportamento humano.
Dodô – No rasto do pássaro do sono quer mais do que “sensibilizar” ou “alertar” para as consequências da intromissão da mão humana na natureza, quer despertar o interesse e as ideias dos seus jovens espectadores, e quer que estes depois de acompanharem a aventura do menino em busca do dodô, procurem saber mais sobre o pássaro que se tornou no símbolo das espécies desaparecidas devido à convivência com o homem.

Sem quaisquer pretensões a uma suposta obrigatória e bem comportada mensagem ecológica que os meninos e meninas terão de retirar do espectáculo, Dodô é um espectáculo que não infantiliza os seus principais espectadores, e que propõe aos seus espectadores que se divirtam eque levem para casa as imagens e palavras que viram como potenciais outros mundos nos quais os limites sejam apenas os da sua imaginação.

Juntem-se, pois, a nós, nesta viagem no rasto do pássaro do sono.

Octávio Teixeira